
Duas semanas antes da cerimônia que divulga os 50 melhores restaurantes do mundo segundo a revista britânica Restaurant, a Netflix colocou no ar a segunda temporada de Chef’s Table. A série de documentários entrou no ar na sexta, 27 de maio, com o tão aguardado episódio sobre o paulistano Alex Atala. Mas Atala não é o único a quem prestar atenção. A sequência sugerida pela plataforma intercala um americano, um brasileiro, uma francesa radicada nos EUA, um mexicano, uma eslovena e um indiano morando na Tailândia, e dá ritmo para assistir em maratona.
A lista selecionada pelo criador David Gelb não é à toa. Se todos os chefs entrevistados caminham sob a linha tênue entre a vida pessoal e profissional, os episódios da primeira temporada trazem personalidades que transparecem obsessão e encontro do sentido da vida por meio da cozinha. Os dramas pessoais – uma doença avassaladora, uma ruptura familiar, a perda de um ente querido, a desorientação na carreira, as dificuldades financeiras – e o aprendizado inexorável que trazem os erros parecem ser o subtema da segunda temporada.

O primeiro episódio retrata o fluxo irrefreável de criatividade de Grant Achatz, chef do 26º melhor restaurante do mundo segundo a lista do 50 Best: o Alinea, em Chicago.

Sua aspiração é fazer algo que não existe e por isso não vê limites para o lúdico e a brincadeira com formatos: balões de açúcar? Uma sobremesa diretamente na toalha de mesa? Achatz garante que tudo isso seja servido, mesmo nos momentos em que esteve afastado da cozinha por motivos de saúde. Como a série usa o recurso da jornada do herói até a última colherada, não seria justo com o leitor elencar todos os seus reveses. Este primeiro episódio é o que dá a tônica para a temporada inteira: uma procura radical por extrapolar limites.

Na sequência, Alex Atala desbrava outras fronteiras, tal qual um bandeirante. As bordas que dissolveu não foram as do prato, como Achatz, mas a de seu território.

Paulistano,o chef foi à Amazônia procurar a essência do Brasil e com saúvas, farinha de mandioca e tucupi, está desde 2011 no ranking dos dez melhores do mundo revista Restaurant. Na lista mundial de 2015, seu restaurante D.O.M. ficou em nono lugar.

Recém-eleita a melhor chef do mundo, Dominique Crenn é francesa e, diferentemente dos outros chefs retratados nas duas temporadas da série, sua incursão no mundo da alta gastronomia foi aos nove anos. Os movimentos, a apresentação e o clima do restaurante nunca saíram de sua cabeça.

Em 1988 partiu para os Estados Unidos, onde está radicada, para iniciar sua carreira como cozinheira profissional. Dominique é a única mulher no país a ter duas estrelas Michelin. Seu menu é em versos, sem descrição de pratos. Ela diz que serve sua alma toda noite no Atelier Crenn, nome escolhido para homenagear seu pai. Seu menu e suas memórias são feitas das mesmas coisas.

O quarto episódio é do sorridente Enrique Olvera, que já foi um chef sisudo. Também ele aprendeu na idade adulta a comer formigas e a deixar sua cozinha bailar à vontade com música durante o expediente – e trabalhar com menos rigidez.

Ocupando o 16º lugar na lista dos 50 Melhores do Mundo, o Pujol serve tacos, moles e outros pratos típicos da culinária mexicana em um ambiente e com técnica de restaurante de alta gastronomia. Borrou as fronteiras entre comida de rua e comida de chef como poucos.

A segunda mulher que conta sua história na série é Ana Roš, uma eslovena ex-futura-diplomata, que ao negar um cargo em Bruxelas escolheu o caminho árduo dos auto-didatas. Sem formação profissional na cozinha, Ana levou cinco anos aprendendo na marra técnicas e usando ingredientes em combinações inusitadas.

Hiša Franko, o restaurante centenário que comanda ao lado do marido sommelier, foi listado no Discovery Series The Diners Club, também parte da premiação anual da San Pellegrino. Ao retratar os melhores, o diretor da série David Gelb evidencia a solidão e as dúvidas de quem está no topo.

Gaggan Anand fecha a sequência. Único episódio dirigido pessoalmente por Gelb na temporada, o com o chef do restaurante Gaggan, o melhor da Ásia e décimo melhor do mundo, fica na Tailândia e serve menu inspirado na cozinha indiana. Gaggan abraça seu país mesmo fora dele.

São 23 pratos, a maioria deles bombardeando os comensais nos primeiros dez minutos de refeição. Mas tirou o chicken tikka masala do novo cardápio: quer dar um passo adiante, levar as múltiplas identidades culinárias de seu país de origem para outro patamar, algo que ninguém ainda fez com os sabores da Índia.
San Pellegrino’s 50 Best Restaurants
Se a série despertou no leitor curiosidade pela alta gastronomia, no dia 13 de junho será realizada a cerimônia dos 50 melhores restaurantes do mundo segundo a revista britânica Restaurant para 2016. A lista é a mais aguardada da alta gastronomia e a premiação será em Nova York. O Bom Gourmet fará a cobertura em tempo real.

A série
A primeira temporada, Chef’s Table mostrou os chefs Massimo Bottura (Osteria Francescana, Módena), Dan Barber (Blue Hill, Nova York), Niki Nakayama (N/Naka, Los Angeles), Francis Mallmann (El Restaurante Patagonia, Argentina), Magnus Nilsson (Fäviken, Suécia) e Ben Shewry (Attica, Austrália).
No segundo semestre entra a terceira temporada, que retrata apenas franceses: Alain Passard (L’Arpege, Paris), Michel Troisgros (Maison Troisgros, Roanne), Adeline Grattard (Yam’Tcha, Paris) e Alexandre Couillon (La Marine, Île de Noirmoutier).
Uma quarta temporada foi confirmada pela Netflix para 2017 com os chefs Ivan Orkin (Ivan Ramen, Nova York), Jeong Kwan (Chunjinam Hermitage, no templo Baekyangsa, Coreia do Sul), Nancy Silverton (Mozza, Los Angeles), Tim Raue (Tim Raue, Berlim), Virgilio Martinez (Central, Lima) e Vladimir Mukhin (White Rabbit, Moscou).